Editorial #14: João Samartinho

Transferência de Conhecimento: A atual fixação de núcleos empresariais com o envolvimento da Academia e das autarquias será uma inevitabilidade das regiões do interior?

O triângulo Academia, mundo empresarial e tecnologia, não é suficiente, per si, para soluções onde a transferência de conhecimento possa ser parte integrante na promoção do sucesso empresarial no seio de regiões do interior.

Na realidade, nos últimos dez anos, poderíamos replicar estudos onde se constata que as “assimetrias regionais normalmente traduzem-se, em diferentes níveis de desenvolvimento económico e social, que poderá induzir a processos de vulnerabilidade das regiões levando a aplicação de políticas de desenvolvimento regionais incoerentes, com consequências preocupantes para a coesão social e territorial”, (Morais, 2012), ou outros que nos lembram aspetos que têm de ser ultrapassados, pelas regiões do interior, que além do problema vivido com os aspetos inerentes à coesão social e territorial ainda são fustigadas com aspetos inerentes à desertificação como a redução, nas últimas décadas, da sua densidade populacional e envelhecimento da população local, e onde na solução do problema o PRN (Plano Rodoviário Nacional) não reverteu minimamente a situação. Refere a Revista Transporte y Territorio 15 (2016) que “há locais que, em vinte anos, assistiram à redução do tempo de viagem que os separava para metade (…) em simultâneo, muitos perderam entre 26% e 46% da sua população em favor das áreas mais desenvolvidas a oeste”.

Reverter toda uma situação de desvantagem ou, pelo menos, minorá-la e ao mesmo tempo permitir as alterações necessárias a cada região do interior para que estas possam ter capacidade, atrativos ou mesmo condições diferenciadas, obriga por certo à formação de hubs de criação e transferência de conhecimento, de diferenciação e criação de valor que terão de estar alicerçados na partilha, na cooperação, na capacidade e empenho em processos de cocriação, entre academia e os núcleos empresarias, num espaço interventivo com o qual cada região se identifique.

A aposta terá, no entanto, de ser uma aposta também da região, que envolva as autarquias e o poder local, que crie valor ao envolver aspetos culturais, tradicionais, historicamente identificados e reconhecidos, e que promova a simbiose e reconhecimento entre as populações locais.

Mas para que possa existir uma estratégia bem sucedida para a implementação destes processos teremos sempre que considerar outras variáveis entre as quais poderíamos referir: A necessidade de mudança de mentalidade das famílias, em perceber que nem todos precisam de ter cursos superiores, ou de estudar em Universidades dos grandes centros populacionais como Lisboa, Porto, Coimbra ou litoral. Hoje temos um leque vasto de opções onde se fornece a possibilidade aos jovens de fazerem, na sua região, a sua qualificação e especialização técnica, permitindo-lhes uma realização profissional e a sua fixação no seio do tecido empresarial da sua região; A importância do trabalho conjunto das forças regionais, em particular as autarquias, academia e núcleos empresarias, para garantirem e segurarem os seus jovens na região criando-lhe opções atrativas de realização profissional, ambientes socioculturais adequados e condições económicas mais atraentes; A aposta na produção e na criação e valor dos produtos e serviços, apostando na cooperação internacional, mas também nos mercados nacionais e internacionais acompanhada de soluções e condições para escoamento dos produtos; A aposta em infraestruturas e soluções sustentáveis que conduzam cada vez mais a processos de economia circular, favorecendo também a região ao nível da redução da sua dependência de materiais mas principalmente a identificação da mesma como mais um território verde e amigo do ambiente.

No entanto a solução e os ingredientes não são novos … será, pois, necessária uma grande dose de empreendedorismo e inovação, de parcerias entre academia, empresas, autarquia e principalmente pessoas. Pessoas com capacidade de liderarem o processo, um projeto visionário para a região, que consigam com o seu carisma e liderança unir e reunir todos os parceiros e partes interessadas na construção da região. Pessoas que acreditarem nos seus projetos, nos seus desafios, nas certezas de soluções conjuntas onde toda a comunidade participe e esteja envolvida. Pessoas comuns, mas amantes da sua região, das suas origens, das suas culturas e, principalmente, que queiram viver e construir o seu futuro na sua terra nativa.

João Samartinho
Coordenador do Projeto TransCoTec
Pró-Presidente para a Área da Internacionalização e Cooperação
Politécnico de Santarém